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Flauta de Bisel
A flauta de bisel é um instrumento de sopro de origem medieval, de palheta fixa, com oito furos tapados diretamente com os dedos, muito utilizado hoje no ensino da música. A origem deste instrumento está nos antigos instrumentos folclóricos que ainda podem ser encontrados em diversas partes da Europa hoje, como o czakan, da Hungria (dez furos) ou a flauta dupla da antiga Jugoslávia. Muitos destes instrumentos eram feitos de tubos de bambu ou cana naturais, enquanto a flauta de bisel era um instrumento torneado em madeira. Foi o instrumento musical mais popular na Idade Média.
Ela produz um som melodioso. Como qualquer instrumento musical, para ser tocada, é necessário o estudo das suas técnicas. É o mais antigo dos instrumentos da família de tubo interno. Consiste em um tubo, com furos para sete dedos e um furo para o dedo polegar, que serve como chave de oitava. Talvez a ilustração mais antiga de flauta de bisel seja "O Escárnio de Jesus" (posterior a 1315), um fresco da Igreja de Staro Nagoricvino na República da Macedónia. Existem várias ilustrações de tubos parecidos que podem ou não serem flautas que antecedem este exemplar.
História
O instrumento sobrevivente mais antigo e completo é a chamada flauta de Dordrecht, de meados do século XIII. Essa "flauta medieval" é caracterizada obviamente pelo seu corpo estreito e cilíndrico (o curso largo do tubo interno no meio do instrumento é responsável pela afinação e resposta sonora). A segunda flauta medieval mais ou menos completa, datando do século XIV, é de Göttingen (norte da Alemanha), onde foi encontrada numa latrina na Weender Straßer, número 26, em 1987. A "flauta de Göttingen" faz parte da coleção do Stadtarchäologie Göttingen.
No século XV, a flauta de bisel desenvolveu-se e passou a ser chamada "flauta da renascença", alcançando seu apogeu em meados do século XVI.
Durante o século XVII, foi mais usada como instrumento solo. Antes, era composta de uma ou duas peças. Neste século, ela já era formada por três peças. A sua feição permitia produzir som com mais intensidade e com mais possibilidade de expressão. Muitas dessas formas ainda existem nos dias de hoje em condições de uso. Assim, a flauta de bisel foi sendo utilizada até se tornar um instrumento profissional no século XVIII, mas foi colocada como instrumento amador no século XIX, até que foi sendo quase que substituída pela flauta transversal.
A flauta de bisel alcançou o seu espaço no Novo Mundo, a partir do momento em que os colonizadores europeus perceberam que os índios utilizavam uma cana como instrumento que era assemelhada à flauta de bisel. A presença de flautas de bisel na América do Norte foi documentada já em 1633 quando um inventário de uma plantação em New Hampshire listou 15 flautas de bisel, e um inventário semelhante feito em outra propriedade de New Hampshire informou a presença de 26 flautas de bisel.
Depois do surgimento da orquestra clássica, os compositores procuravam instrumentos com maiores recursos dinâmicos. Assim começa o declínio da flauta de bisel perante a flauta transversal. Por volta de 1750, a flauta de bisel praticamente desaparecera do repertório de qualquer compositor. Assim, a flauta de bisel ficou presente apenas na história dos instrumentos musicais. Somente no final do século XIX é que alguns músicos começaram a ter contacto com este instrumento novamente, através de pesquisa de músicas antigas e através de literaturas musicais existentes em museus. Entre os envolvidos no ressurgimento da flauta de bisel, estão Cristopher Welch (1832-1915) e Canon Francis Galpin. Galpin, além de estudar este instrumento, ensinou a sua família a tocá-lo. Mas foi o inglês Arnold Dolmetsch (1858-1940) que concluiu que a flauta de bisel só renasceria se a sua reconstrução recebesse o mesmo tratamento dos demais instrumentos. O fruto de suas pesquisas permitiu-lhe construir um quarteto de flautas e tocá-las com sua família num concerto histórico no Festival Haslemere em 1926. O seu filho Carl tornou-se um virtuoso no instrumento e elevou-o a um nível de alta interpretação. Este conjunto de flautas feito por Arnold Dolmetsch foi copiado e produzido em série na Alemanha, onde se tornou muito popular.
Tubos de bambu foram introduzidos em escolas dos Estados Unidos nos anos 1920 e depois nas escolas da Grã-Bretanha, quando Hilda King, diretora de uma escola em Londres, começou a ensinar os seus alunos em 1926. O "Grêmio de Flautistas de Bambu", fundado por Margaret James em 1932, foi patrocinado por Louise Hanson-Dyer na França, onde ela pôde promover compositores como Georges Auric, Jacques Ibert, Milhaud, Albert Roussel, Poulenc, Arthur Benjamin da Austrália e Margaret Sutherland, para escrever para este meio.
Em 1935, Edgar Hunt introduzia o ensino de flauta de bisel nas escolas primárias inglesas, e em 1937 foi fundada a "Society of Recorder Player". Aos poucos, a flauta de bisel ressurgia e os compositores começaram a escrever para o instrumento. Com o aumento do número de grandes intérpretes, a flauta de bisel tornou-se um instrumento de pesquisa de técnicas alternativas de execução.
Hoje em dia, as flautas de bisel fabricadas possuem um som mais suave do que as flautas do século XVIII nas quais elas são baseadas. No entanto, estas flautas de bisel neobarrocas permanecem como instrumentos para solo.
Temos, também, hoje, a produção em série de flautas de resina a partir de cópias de originais como, por exemplo, as japonesas Yamaha, Aulus e Zen-on, além de uma série de edições modernas facsímiles de edições antigas e de manuscritos editados na Europa.
Repertório
A flauta de bisel possui um extenso repertório, e quase todas as melodias podem ser adaptadas de algum modo para este instrumento, devido à sua afinação e técnica muito propícias. O repertório para flauta de bisel é necessariamente barroco, medieval e folclórico, embora ela fique bem em quase todos os estilos musicais.
Antonio Lucio Vivaldi (1678-1741) compôs muitos concertos para flauta de bisel, como o RV 441 em dó menor para flauta de bisel contralto, o RV 85 em sol menor para flauta de bisel soprano, e o RV 443 em dó maior para flauta de bisel sopranino. Outros virtuosos para a flauta de bisel foram Jacob van Eyck (1590-1657), com o seu método Der Flüyten Lust-hof, em dois volumes, e Giuseppe Sammartini (1700-1775), que compôs diversas sonatas para este instrumento.
Além destes, temos ainda a Danserye, de Tielman Susato, uma série de melodias renascentistas que se adequavam muito bem aos instrumentos daquela época, e também a diversas variedades de flautas de bisel.
Digitações
As flautas de bisel possuem dois sistemas de digitação, muito utilizados hoje: a digitação germânica e a digitação barroca. Estes sistemas diferem apenas numa leve alteração do diâmetro e posicionamento de alguns furos, o que altera a maneira com que se colocam os dedos na flauta para tocar algumas notas.
A digitação barroca é a original da flauta de bisel, geralmente a mais utilizada por músicos profissionais devido à facilidade técnica que ela proporciona para a execução do instrumento. A digitação germânica foi criada acidentalmente na Alemanha (daí germânica) na década de 1920, e verificou-se que ela traz facilidade na execução da escala de dó maior: portanto, apropria-se mais para a musicalização infantil a qual a flauta de bisel costuma destinar-se. Contudo, a digitação germânica prejudica a afinação da flauta e impõe dificuldades de técnica para músicos mais avançados.
Afinações
Antes de qualquer execução, o instrumento deve ser "aquecido", o que será feito soprando-se lentamente pela boquilha. Com esse aquecimento, a flauta de bisel terá a sua afinação melhorada para tocar.
A flauta de bisel é um instrumento cuja dinâmica sonora é tímida, devido ao seu tamanho e espessura do seu tubo. Atualmente, a flauta de bisel é afinada em lá = 440 hertz, para acompanhar aos demais instrumentos modernos, embora os instrumentos originais do período Barroco fossem afinados em lá = 415 hertz.
Existem muitas variedades de flautas de bisel, em tamanhos e afinações; é o que se chama de "família das flautas de bisel". Todas as flautas de bisel possuem uma gama de pouco mais de duas oitavas. Temos a flauta de bisel "sopranino" (gama: F4 a G6), a flauta de bisel "soprano" (gama: C4 a D6; é a variedade mais conhecida), a flauta de bisel "contralto" (afinada uma oitava abaixo da flauta sopranino), a flauta de bisel "tenor" (afinada uma oitava abaixo da soprano), a flauta de bisel "baixo" (afinada uma oitava abaixo da contralto) e a flauta de bisel "grande-baixo" (afinada uma oitava abaixo da tenor).
Existem, ainda, variedades menos utilizadas, como a flauta de bisel garklein (afinada uma oitava acima da flauta soprano), a flauta de bisel piccolino (afinada uma oitava acima da flauta sopranino), a flauta de bisel "contrabaixo" (afinada uma oitava abaixo da flauta baixo) e a flauta de bisel "sub-contrabaixo" (afinada uma oitava abaixo da flauta grande-baixo).
As teorias musicais das flautas de bisel são escritas neste esquema:
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flautas de bisel piccolino e garklein - clave de sol 15ª acima;
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flautas de bisel sopranino e soprano - clave de sol 8ª acima;
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flautas de bisel contralto e tenor - clave de sol;
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flautas de bisel baixo e grande-baixo - clave de fá 8ª acima;
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flautas de bisel contra-baixo e subcontra-baixo - clave de fá.
Segundo alguns especialistas em Música, a flauta de bisel é a extensão da voz humana, porque as suas tassituras, gamas e afinações são muito próximas da voz humana.