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Harmónica
A harmónica, harmona, gaita-de-beiços, gaita de boca, ou simplesmente gaita (conhecida como realejo em algumas zonas de Portugal), é um instrumento musical de sopro cujos sons são produzidos por um conjunto de palhetas livres.
A harmónica possui na sua embocadura um conjunto de furos por onde o instrumentista sopra ou suga o ar. Devido ao seu pequeno tamanho, a harmónica não possui caixa-de-ressonância. O músico pode usar as mãos em concha para produzir variações de intensidade. Quando executada em conjunto com outros instrumentos, é comum que ela seja amplificada eletronicamente. A harmónica é bastante usada no blues, rock and roll, jazz e música clássica. Também são muito comuns os conjuntos compostos apenas de harmónicas, as chamadas Orquestras de Harmónicas, que normalmente tocam músicas tradicionais ou folclóricas.
História
A harmónica teve a sua origem num antigo instrumento chinês, o sheng, que foi inventado há mais de cinco mil anos e que funciona pelo princípio de palhetas livres. Esta técnica de produção sonora gerou uma grande família de instrumentos acionados por foles ou bombas de ar, como o acordeão e a melódica. Em órgãos é comum que alguns tubos sejam flautados e outros utilizem palhetas livres para produzir sons com timbres diferenciados.
Em 1821 um relojoeiro alemão chamado Christian Ludwig Buschmann inventou um instrumento semelhante à harmónica atual com 15 palhetas e 10 cm de comprimento, mas esse instrumento foi encarado como um brinquedo e não foi considerado adequado para a execução musical. Em 1857 um outro relojoeiro alemão, Matthias Hohner, fundou uma companhia e começou a fabricar as chamadas harpas de boca ou órgãos de boca com 10 furos. O instrumento passou a vender muito bem na Alemanha, França, Itália e Estados Unidos.
Na Europa a harmónica tornou-se um instrumento muito popular na música folclórica e surgiram bandas e orquestras especializadas neste instrumento. Nos Estados Unidos foi muito utilizada na música country. Com o surgimento do blues no início do século XX, a harmónica chegou ao seu auge e daí garantiu a participação em outros géneros musicais, como o jazz, folk music, rock and rol e até na música clássica.
Hoje com a popularização do instrumento existem diversos fabricantes de harmónicas espalhados pelo mundo: Hering no Brasil, Hohner e Seydel na Alemanha, a Suzuki no Japão e a Lee Oskar nos E.U.A.
Construção e funcionamento
A harmónica é um instrumento de palheta livre, como o acordeão, órgão de palhetas e o bandoneón. Diferentemente destes instrumentos, não é um fole que força o ar através das palhetas, mas sim o sopro do executante.
As palhetas são finas lâminas retangulares de metal que são montadas sobre uma placa de suporte. Para cada palheta, existe na placa uma fresta com o tamanho exato para que a palheta possa movimentar-se livremente dentro dela sem que haja folgas. Cada harmónica possui duas placas de palhetas que são montadas sobre um corpo em forma de pente ou grelha, feito de plástico ou madeira. A função desta peça é direcionar o ar individualmente para cada palheta. Quando o conjunto é montado cada furo do pente fica com uma palheta em sua parte superior e outra na parte inferior.
Ao soprar, o único caminho de saída do ar é através das palhetas e o caminho de menor resistência é a palheta superior, que se curva para permitir a passagem do ar. Quando isso acontece, a resistência do ar diminui e a força já não é mais suficiente para manter a palheta curvada. Pela elasticidade do material ela volta à posição original fechando novamente a fresta. O processo todo repete-se e a vibração da palheta produz um som audível. O mesmo ocorre quando o músico suga o ar através do furo, mas nesse caso o caminho de menor resistência é o furo inferior, que vibra produzindo uma nota diferente da superior.
Bends
Se o músico desejar, pode fazer o ar passar pelo furo em um ângulo tal que permita a vibração simultânea das duas palhetas do furo. O resultado é a produção de notas que estão entre a nota mais aguda e a mais grave do furo. Esta técnica é conhecida como bend (em inglês: dobrar. O nome é uma alusão ao brend da guitarra, uma técnica que consiste em esticar uma corda para que produza uma nota de afinação mais alta que sua afinação normal). De facto, ao usar esta técnica o músico consegue "esticar" o registo do instrumento adicionando notas intermediárias ou glissandos, um efeito muito usado no blues e na música country norte americana. Embora desejado em harmónicas de blues, o bend em geral não é usado na execução de jazz ou música erudita, por isso, algumas harmónicas (principalmente as cromáticas) possuem válvulas que impedem a vibração simultânea das duas palhetas e, portanto, evitam um "esticamento" mais exagerado das notas, embora um bend menos intenso de até meio-tom ainda possa ser executado.
Tipos de harmónicas
Em princípio, as placas de palhetas podem ser montadas com qualquer combinação de notas, por isso existem vários tipos de harmónicas que variam de acordo com quantidade de furos, a escala, a extensão ou registo (conjunto de notas que podem ser produzidas pelo instrumento) e a disposição das notas nos furos.
Harmónica diatónica
Também chamada de harmónica de blues, tem 10 furos e uma extensão de três oitavas. As palhetas são dispostas nos furos de maneira a permitir a execução individual das notas da escala diatónica maior. Também permite tocar acordes se mais de um furo for usado simultaneamente (o músico controla quantos furos toca de cada vez pela posição dos lábios ou bloqueando os furos com a língua). No layout padrão da harmónica diatónica, é possível obter o acorde da nota fundamental (I) e o da dominante (V).
Harmónica cromática
A harmónica cromática é uma evolução da diatónica, criada para permitir a execução melódica de músicas em qualquer tonalidade, com modulações e acidentes eventuais e sem as variações de afinação produzidas pelo bend. Para isso ela possui duas palhetas de sopro e duas de sucção em cada furo e uma chave que o músico aciona com o indicador da mão direita para direcionar o ar para cada par sopro / sucção. Quando a chave está solta, a harmónica produz as notas naturais (sem acidentes - correspondentes às teclas brancas do piano). Quando a chave é acionada são produzidas as notas com acidentes (bemóis e sustenidos - correspondentes às teclas pretas do piano). Além disso, todas as palhetas possuem válvulas para impedir que as palhetas de sopro e sucção soem simultaneamente. Por isso não é possível executar bends numa harmónica cromática a não ser que estas válvulas sejam removidas. Mas há exceções, alguns artistas conseguem executar "meios bends", ou efeitos de bends. As harmónicas cromáticas normalmente possuem 12 ou 16 furos para uma extensão de três ou 4 escalas completas, sendo que atualmente já se fabricam harmónicas cromáticas com 10 e 14 furos.
Outros tipos de harmónica
Além da diatónica e da cromática existem muitas outras configurações usadas principalmente nos conjuntos ou orquestras.
Harmónica tremolo
Esta harmónica possui duas palhetas em cada furo que estão ligeiramente desafinadas uma em relação à outra. Isso produz a sensação de tremolo, uma espécie de vibração na afinação. Estas harmónicas possuem tamanhos variados, normalmente 16 ou 24 orifícios. A de 16 orifícios (32 vozes) tem abrangência de 2 oitavas, e a de 24 orifícios (48 vozes), 3 oitavas.
Harmónica em oitava
Possui duas palhetas em cada furo afinadas com intervalo de uma oitava entre elas.
Harmónica de acordes
Para cada tonalidade, permite a execução de 48 tipos diferentes de acordes, sendo 12 acordes maiores, 12 menores, 12 com sétima, 6 aumentados e 6 diminutos. A fábrica alemã Hohner e a japonesa Suzuki são as únicas a produzir este tipo de harmónica.
Músicos famosos
Os instrumentistas mais destacados da harmónica diatónica estão no blues e country. Alguns criaram formas de interpretação que se tornaram referência para outros instrumentistas. Entre eles destacam-se James Cotton, Carey Bell, John Mayall, Sonny Boy Williamson, Junior Wells, Snooky Prior e Little Walter.
Na folk music e no rock and rol muitos músicos utilizam a harmónica para executar solos e riffs (pequenos temas que são tocados ao longo de uma canção de forma repetitiva). Bob Dylan desenvolveu um estilo próprio que se tornou modelo para todos os músicos folk como Bruce Springsteen. Entre outros intérpretes que também utilizam ou utilizaram a harmónica ocasionalmente estão Jack Bruce do Cream, Stevie Wonder, Roger Daltrey do The Who, Mick Jagger e Brian Jones dos Rolling Stones, Steven Tyler do Aerosmith, Ozzy Osbourne do Black Sabbath, Robert Plant do Led Zeppelin, David Gilmour do Pink Floyd, John Lennon dos Beatles, Janis Joplin, Christopher Wolstenholme do Muse, Alanis Morissette, Lemmy do Motörhead, Tom Petty, Neil Young, Eddie Vedder do Pearl Jam, Billie Joe Armstrong do Green Day, David Desrosiers do Simple Plan e outros.
Com a harmónica cromática, Stevie Wonder definiu o estilo mais conhecido na música pop. No jazz um dos mais influentes é o belga Toots Thielemans. O norte-americano Larry Adler, já falecido, também se notabilizou executando bastante a música clássica e o jazz. Na clássica destacam-se o canadense Tommy Reilly, o chinês Cham-Ber Huang e o italiano Willi Burger.